terça-feira, 19 de julho de 2011

Nomes fazem parte do nosso universo particular

Lane Valiengo

        Nomes são coisas interessantes: eles fazem parte do universo particular de cada pessoa, fazem parte do ambiente que criamos para sobreviver. A visão que temos da cidade em que vivemos é feita, também, de nomes que têm importância para cada um de nós. Alguns desses nomes somos nós mesmos que incorporamos à nossa vivência, à nossa história de vida. Outros fazem parte da própria História do lugar em que vivemos. Cultuamos nomes que de alguma forma foram ou ainda são importantes para a composição do nosso comportamento característico, para a nossa visão de vida e de mundo.
        É por isso que alguns nomes têm muito valor para uma pessoa e nenhum peso para outras. Através dos nomes do nosso universo é que nos reconhecemos, nos identificamos, nos situamos social e culturalmente. E existem ainda aqueles nomes que representam, individualmente, a lembrança de sentimentos, de momentos, de acontecimentos.
        A nossa “memória nominal” é algo que muitas vezes independe da vontade: os nomes se agregam naturalmente, mesmo que se abriguem no nosso subconsciente. Muitas vezes eles ficam lá, quietinhos, invisíveis, sorrateiros, até.  De repente, surgem assim do nada. Nomes vividos são nomes incorporados. Nomes lembrados são nomes eternos.
        São parte da nossa herança e do nosso cotidiano. Diga-me com que nomes andas e te direi o que viveste. São parte do nosso ser, aderindo à nossa essência. São referências e são exemplos. São parâmetros e são sinalizadores que indicam qual o caminho a seguir em direção ao presente e ao futuro imediato.
        Pense nos seus nomes particulares. Quais deles são os nomes que revelam o que significa a cidade em que você vive?
        Quem nasceu e viveu até certa idade em um lugar e depois mudou, terminando de crescer com outras referências,
sabe bem como se dá esse fenômeno de incorporação de uma outra cultura, de um novo imaginário. Nomes e fatos nos situam na nova realidade, ganhamos aos poucos novas referências. Quando o interesse nos faz descobrir a História, reconhecemos que os nomes passados deixaram sua marca, sua influência, mesmo que muitos deles permaneçam injustamente esquecidos.
Quem nasceu em terras planaltinas mas viveu a maior parte da vida respirando ares litorâneos, como acontece comigo, costuma, no mínimo, identificar as características fundamentais de cada local. Sabe que lá, Serra acima, o mundo gira de forma mais séria. Não que isso seja um bom atributo, mas as oportunidades são mais amplas, é certo. Dizem que lá se respira um ar mais contemporâneo, cosmopolita. E que as pessoas, em geral, assimilam esse atributo. Mas o paraíso fica aqui, com todos os seus defeitos urbanos, políticos e sociais. Impossível não se apaixonar e incorporar a alma santista.
        Talvez a grande diferença é que lá é um santo só. Aqui, são todos.
        Além do mais, a Anchieta e a Imigrantes estão logo ali...
        Interessante é de vez em quando relembrar e relacionar os nomes referenciais que nos são caros, pois eles podem revelar um pouco daquilo que somos, podem explicar certas facetas particulares do nosso comportamento.
        Tudo é exercício: pessoalmente, penso logo em nomes de pessoas mais próximas, de santistas que contribuíram para a formação da personalidade que carrego. De tempos em tempos, alguns nomes até então adormecidos ganham nova relevância. É o caso do nome Taibo Cadórniga. Provavelmente representa o desejo de viver politicamente, de engajamento permanente. De acreditar que só é possível viver dentro de uma ação política de fato.
        Além do mais, João Taibo Cadórniga, além de ativista, sindicalista e deputado, foi também um poeta (“Nos porões da imensa noite /crescem rostos invisíveis”; “Louvados sejam os cursos desviando rotinas /tambores flamejantes ruindo apatias”). Falando em poetas, nomes permanentes são Roldão Mendes Rosa e Narciso de Andrade, mestres e companheiros. Ensinam a olhar, a compreender, a valorizar as coisas. Vida superlativa, vida vivida. Filosofando assim, o nome é João José Itagyba Mariuzzo, o Paderewisky, pianista, professor do universo canadense, mentor e orientador, revelando mecanismos mentais, formando gerações e gerações, homem das idéias e das partituras.
        Partituras lembram Gilberto Mendes, sempre novo, sempre inventivo, sempre lúcido, renovado, o primeiro entrevistado. E que trouxe a Santos um gênio chamado Frederick Anthony Rzewski, em 1989. O grande Geraldo Ferraz marcou primeiro por sua personalidade, aparência sempre fechada, séria, e depois pela beleza de seu "Doramundo". Mas beleza mesmo era a matéria prima do Lucio Menezes, irmão do Oscar: suas telas sempre fascinaram, extasiaram, fizeram sonhar.
        O irmão, Oscar Menezes, irriquieto jornalista, avoado, sempre ensinando como escrever e como encarar os fatos. Pois escrever perfeitamente e ainda explicar a raiz latina de cada palavra era a especialidade do Antonio Henriques, o Mineiro, que se perdeu nas terras brasilienses. Editar era com o Clóvis Galvão, chefiar era com o Alcir Correa de Mello, modelo de repórter político. Criar mesmo era com o José Roberto Fidalgo e orientar era com o Ouhydes Fonseca. Quem não aprenderia? Ainda mais com a Miriam Guedes protegendo e mostrando os caminhos...
        Mas quem influenciou mesmo foi a Leda Mondin, com seu texto maravilhoso, seu sentido de ética e sua responsabilidade social.
        E ainda havia o Paulo Mattos, o riso fácil junto com a seriedade histórica e o ativismo político. Era uma grande consciência particular, amizade partida de repente.
        Da convivência, a influência: Adelino, o Pedro, o Rodrigues, coragem permanente, assimilação instantânea, afinidade absoluta. E Esmeraldo, sempre, de coração.
        Para mim, são os nomes que dão o tom da cidade e que são em grande parte responsável pela minha formação.

* leia também "Nomes santistas".

Nenhum comentário:

Postar um comentário