sexta-feira, 1 de abril de 2011

OS CRISTÃOS NOVOS E A MUDANÇA DO NOME

Lane Valiengo

                   Sobreviver é preciso, acima de tudo.

                   Pensando assim, milhares de judeus europeus trocaram seus nomes, para escapar à perseguição movida pela Santa Inquisição. Essa verdadeira etimologia da sobrevivência incluiu a conversão à religião católica, em Portugal e na Espanha. A consequência óbvia é que muitos judeus fugiram para o Brasil, pensando provavelmente que aqui a Inquisição não os alcançaria.  

                   Isabel de Castela e Fernando de Aragão, reis católicos de Espanha, expulsaram os  judeus em 1492. Cerca de 60 mil deles não aceitaram se converter ao catolicismo e fugiram para Portugal. Para permanecer, foram obrigados a pagar quantias elevadas à Corte. Em 1497, apesar da tolerância do rei Dom Manuel, uma lei impôs a expulsão dos judeus. Para evitar a evasão de capital, a Coroa decretou conversão forçada de muçulmanos e judeus ao Cristianismo. Surgiu então a denominação de “cristãos novos”.

                  Mas o “Massacre de Lisboa”, revolta popular contra os judeus, insuflada pelos frades dominicanos, fez com que muitos cristãos novos abandonassem Portugal. Fugindo da “Santa Inquisição” e da ira do “Santo Ofício de Roma”, eles começaram de fato a colonização do Brasil.

                   Um ano após o descobrimento, uma expedição exploratória chegou em terras brasileiras, com três embarcações sob o comando de Américo Vespúcio. Este relatou ao Rei Dom Manuel que não haviam  no Brasil metais ou pedras  preciosas. Sem ouro e prata, pensou o Soberano, o melhor seria arrendar o Brasil para um grupo de homens de negócios. Assim, a primeira concessão coube a uma associação de cristãos novos, encabeçada por Fernando de Noronha.

                   Outros detalhes comprovam que os judeus foram os responsáveis pela colonização inicial, de fato: os principais oficiais da armada de Pedro Álvares Cabral eram cristãos novos, incluindo o próprio Cabral. E antes de Martin Afonso de Souza fundar São Vicente (que já existia...),  andava por aqui o polêmico “Bacharel”  de Cananéia, provavelmente um cristão novo exilado em terras brasileiras. As diversas interpretações existentes dizem que o Bacharel seria Cosme Fernandes, Gonçalo da Costa ou, conforme prefere o historiador Candido Mendes, o Bacharel não seria outro a não ser o próprio João Ramalho (também um cristão novo).

                   Alguns defendem a tese de que, nas descrições sobre o descobrimento do Brasil, quando se fala em “portugueses”, na realidade seriam os judeus os verdadeiros protagonistas. Segundo Marcelo M. Guimarães, de 1503 a 1530, milhares de cristãos novos vieram para o Brasil.

                   Em 1531, Roma indicou um Inquisidor Oficial para Portugal e em 1591 um oficial da Inquisição foi designado para a Bahia. Em 1624, foram processados os primeiros 25 judeus brasileiros.

                   Foram eles: Ana Alcoforada, Heitor Antunes, Beatriz Antunes, Ana da Costa, Brites da Costa, Manoel Espinosa Dias, Paula Duarte, Diogo Laso Gonçalves, Catarina Favella, Beatriz Fernandes, Diogo Fontes, Lopez Matheus Franco, Diogo Lopez, Guiomar Lopez, Salvador da Maia, Henrique Mendes, Antonio Felix de Miranda, João Nunes, Ana Rois, João Pereira de Souza, Beatriz de Souza, Bento Teixeira, Diogo Teixeira e André Lopes Ulhoa. Esta relação encontra-se na Torre do Tombo, em Lisboa.

                                      A verdade dos nomes

                O que realmente nos interessa é a questão da troca dos nomes. Forçados a abandonar o judaísmo e a repudiar os postulados hebreus, mesmo assim foram vítimas de perseguições, humilhações, e torturas durante três séculos, sem contar os que foram lançados às fogueiras.

                   Segundo o livro “As raízes judaicas no Brasil”, de Flávio Mendes de Carvalho, por ocasião da conversão os cristão novos adotaram nomes de cristão antigos, o que significa que os sobrenomes, por exemplo, não necessariamente são de origem judaica.

                   Há uma falsa crença, no Brasil, de que os judeus escolheram tipos específicos de nomes, como plantas, vegetais, frutos e animais. Trata-se de mito: pode ser ou pode não ser. Muitos escolheram nomes absolutamente comuns. Mas a pesquisa de Mendes de Carvalho aponta nomes variados, que vão desde Abreu, Affonso, Ayres, Aguiar, Azevedo e Antunes, até Vale (ou Valle), passando por Azevedo, Bacelar, Baptista, Barbosa, Lobo, Macedo, Machado, Oliva, Paixão, Pacheco, Passos, Paz, Lago, Laguna, Leal, Lima, Leão, Jordão, Julião, Cruz, Cunha, Marçal, Martins, Caetano, Céspedes, Carneiro, Taveira,  Pimentel, Rosas, Rocha e etc.
                  
                   O que resta é a constatação de que o episódio representa talvez a maior mudança de nomes em massa da História Ocidental.

                   Tudo por uma questão de sobrevivência.

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